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terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Ensino médio afasta aluno da escola

Etapa foca apenas no preparo para o vestibular, mas não prepara jovens "para o mundo", segundo educadores.

Cinthia Rodrigues, iG São Paulo | 22/02/2011 07:00

Até a 8ª série, Evelyn Manuel Rodrigues era a típica boa aluna, com caderno caprichado, gosto pelos estudos e notas acima da média. Na 1ª série do ensino médio, seu rendimento caiu, faltou várias vezes às aulas, chegou atrasada tantas outras, acabou reprovada e desistiu de estudar. Longe de ser uma exceção, ela entrou para um grupo que consiste na metade dos estudantes desta etapa de ensino: os que desistem antes de terminá-la. A escola não consegue manter o interesse dos adolescentes.
A falta de atratividade é tema da segunda reportagem da série do iG Educação sobre o ensino médio. Além dos alunos que deixam de estudar nesta fase, muitos dos que ficam não demonstram vontade de aprender, o que contribui diretamente para torná-la a pior etapa da educação brasileira.

O ensino médio, como está, é algo inútil na vida da maioria dos jovens”, afirma Elizabeth Balbachevsky, livre docente do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora participante de grupos internacionais na área de educação para jovens. Para a ela, a orientação para o vestibular, objetivo de quase todas as escolas desta etapa é um desperdício.
“Para quem não está na perspectiva de entrar na faculdade, a sala de aula não tem nada a oferecer. O ensino brasileiro tem uma carga muito forte, toda preparatória para o acesso à universidade e não para a vida ou o curso superior em si”, comenta. O problema é que a maioria não vai prestar o tão esperado processo seletivo, principalmente antes de experimentar primeiro o mercado de trabalho: só 15% dos jovens brasileiros de até 29 anos fizeram ou estão fazendo um curso superior. Nos países mais desenvolvidos esta porcentagem dobra, mas ainda fica muito longe de ser maioria.
O coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, concorda que o foco do ensino médio precisa ser ajustado. “No mundo todo, a fase tem um caráter terminativo. Dali para frente a pessoa está preparada para começar a vida adulta, pode até ser na faculdade, para quem quer, mas também pode ser trabalhando ou em qualquer projeto. A educação básica está concluída”, diz.
Hoje aos 19 anos, Evelyn Rodrigues, a jovem que abre esta reportagem, percebeu a falta que lhe faz os estudos. Nos três anos em que ficou longe da sala de aula, trabalhou como tosadora de cães, foi morar com o namorado e ficou grávida. “Nesta época, eu queria trabalhar. Quando arrumei um emprego, achei que estava aprendendo mais lá do que na escola. A aula parecia não ter muito haver com minha vida. Agora sei que era fundamental para melhorá-la.”
Formação do ser humano
Nem só o mercado de trabalho precisa de jovens bem formados. O professor de Políticas Educacionais da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e diretor da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), Pablo Gentile, lembra que os jovens também são cidadãos, eleitores e ajudam a definir a cara da sociedade brasileira. "O ensino médio deveria se preocupar com a formação do ser humano", resume. Ele entende que a adolescência é um momento de transformação da pessoa e, portanto, é essencial que bons valores sejam apresentados. "O ensino médio é uma oportunidade impar para que o jovem se depare com o conhecimento que vai torná-lo ativo e produtivo”, afirma.
Para ele, em vez de um conteúdo voltado ao vestibular ou ao mercado de trabalho imediato, as escolas deveriam focar nas disciplinas que ampliam o entendimento do mundo em que vivem, com noções de política, filosofia, sociologia, ciências, português e matemática. O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) tenta atrair a escola para esses focos, ao solicitar nas provas de acesso a boa parte das universidades públicas mais conhecimentos gerais e capacidade de raciocínio do que conteúdos específicos. “Um cidadão melhor se tornará, inclusive, bom profissional.”

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